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Liberação do uso de máscaras: os dois lados de uma mesma moeda







Mesmo após a liberação do uso de máscara (no dia 10 de março), o cenário nas ruas não é tão diferente de antes dela. Em uma ida rápida ao centro de Brasília, é possível reparar pessoas utilizando a proteção, tanto em espaços abertos, como em lugares fechados, confirmando os dados da pesquisa feita pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) em parceria com o Instituto FSB Pesquisa. O estudo aponta que 55% da população brasileira opta por usar a proteção facial independentemente do ambiente, sejam vacinados ou não.

Naquele dia 10 de março, uma quinta-feira, o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), decretou a desobrigação do uso de máscara em ambientes fechados no DF. Como justificativa, Ibaneis alegou o avanço na vacinação contra covid-19 e a queda do número de casos da doença e de leitos de UTIs ocupados por cidadãos contaminados. A medida veio para complementar outra, de novembro de 2021, quando o governador utilizou da mesma premissa para deixar de exigir o uso da proteção ao ar livre.

Diante desse cenário, a equipe de reportagem da Agência de Notícias CEUB decidiu investigar o porquê dos entrevistados ainda utilizar o “escudo” facial, ao mesmo tempo que também apurou o motivo pelo qual outras pessoas optaram não utilizar a proteção.

Por que ainda usam?
Luis, de 74 anos, que preferiu não ser identificado pelo sobrenome, é morador da Cidade Ocidental e, mesmo com as três doses da vacina, conta que ainda tem um pé atrás para deixar de usar a proteção facial. “Eu venho de lá (Cidade Ocidental) para resolver alguns problemas aqui em Brasília e, por ser um ambiente muito movimentado, sempre uso a máscara. Até quando estou lá não me sinto seguro o suficiente para deixar de usar”, relata o aposentado.

Quando perguntado se, para ele, Ibaneis acertou na decisão, o senhor demonstrou insatisfação. “Acho que não foi o momento certo de o governador desobrigar o uso (de máscara), já que a pandemia ainda nem acabou direito”, disse. Seguindo a mesma lógica, ele completou mostrando intenção de usar a proteção futuramente, em lugares fechados ou abertos.

Assim como Luis, o jovem vendedor Leandro José, 21, também continua usando máscara depois da liberação e das doses completas da vacina. Ao ser questionado se continuará usando a proteção no futuro, Leandro respondeu que acredita que a prática já se tornou um hábito que prevalecerá. Ele ainda citou o Japão como exemplo de sucesso. “Antes da pandemia, quando os japoneses tinham alguma gripe, usavam máscara para prevenir doenças e isso se tornou algo cultural. Então acho que é uma coisa que a gente pode levar para vida aqui no Brasil”.

Para o infectologista Hemerson Luz, a cautela de Luis, Leandro e de 59% dos entrevistados totalmente imunizados do estudo da CNI com o Instituto FSB é justificável. Segundo ele, o momento ainda exige o uso da proteção em situações específicas. “Pessoas sintomáticas, que têm os sintomas respiratórios ou de gripe, nariz entupido, coriza, dor de garganta, tosse ou mesmo febre, devem continuar utilizando a máscara. Caso ocorra de muita gente permanecer num espaço pequeno e de ventilação inadequada o uso também é recomendável. Idosos acima de setenta anos e cidadãos que andam no transporte público são outros exemplos que precisam da máscara como um nível de segurança a mais”, explica o infectologista.Crédito: Gabriella Tomaz e Nathália Guimarães – Dados retirados da Pesquisa da CNI com a FSB
E quem já deixou de usar?

O vendedor Alec, que também não quis se identificar pelo sobrenome, 25, assume que, após as três doses, ansiava pelo momento que o uso da proteção em lugares abertos e fechados não seria mais obrigatório e, por isso, não pensou duas vezes quando teve o aval do governador. Ao mesmo tempo, ele pondera que, em transportes públicos, ainda não se sente seguro e faz o uso de máscara.

A agente de segurança Paula Cecília, 21, compartilha da mesma opinião que Alec, e relatou à equipe de reportagem que, em espaços abertos, não faz mais a utilização da proteção justamente por dispor de vacinação completa. Por outro lado, em lugares fechados, Paula ainda utiliza o escudo facial por precaução.

Segundo a pesquisa da CNI em parceria com o Instituto FSB, 37% dos vacinados (com segunda, terceira ou dose única) já deixaram de usar a proteção em locais abertos, mantendo-a no rosto somente em espaços fechados. Segundo a Pesquisa da CNI com a FSB, 37% dos vacinados (com segunda, terceira ou dose única) usam a proteção apenas em locais fechados, como por exemplo, no transporte público. 

A infectologista Joana D’Arc Gonçalves da Silva diz que, para ela, os relatos dos cidadãos são importantes para dar uma resposta sobre a assertividade da medida. No entanto, ela ressalta que cada um precisa avaliar seu risco para tomar a decisão de manter ou descartar a máscara. “Desobrigar o uso deu liberdade. É opção de escolha, quem se arrisca assume a ameaça, o ruim é que pode expor os demais. Contudo, acredito que o susto da população se deu por conta da proximidade da data ao Carnaval e, com ele, vem a possibilidade de aumento do número de casos”, comenta Joana D’arc.
Olhando para o futuro

Logo depois da liberação do não uso da máscara em março, o cenário não mudou de imediato. Foram necessários alguns dias para vermos nas ruas as primeiras pessoas deixando de utilizar a proteção facial. Afinal, a medida era aguardada por uma parcela da população, que desejava que o velho normal pudesse, aos poucos, voltar. De acordo com a pesquisa da CNI com o Instituto FSB, 35% dos entrevistados pretendiam continuar utilizando a proteção após a liberação, enquanto 28% afirmaram que abandonariam o uso da máscara após o decreto.

O panorama recente ainda gera dúvidas e, para ajudar o leitor a compreendê-lo melhor, a equipe de reportagem da Agência de Notícias do CEUB aproveitou a oportunidade para sanar possíveis dúvidas com Joana D’Arc e Hemerson Luz, infectologistas já referenciados nesta reportagem. Ambos atuam em hospitais no Distrito Federal. Confira abaixo a entrevista com os especialistas:

Na sua opinião, a liberação do uso de máscaras no DF foi prematura?

Hemerson Luz: A taxa de transmissão atual permite a retirada das máscaras. Porém, a população precisa entender que tanto as medidas de liberação quanto as restritivas podem ser tomadas a qualquer momento, de acordo com o comportamento dos números. Caso haja um aumento no número de casos, talvez seja necessário utilizar a máscara novamente em algumas situações. Como por exemplo, em locais fechados. Mas por hora, a decisão de retirar as máscaras foi tomada numa situação de análise dos números, e esses números deverão continuar sendo analisados pelas autoridades sanitárias.

É possível que novas variantes possam surgir ao longo dos próximos meses?

Joana D’Arc Gonçalves: Com certeza, temos bolsões de não vacinados e muita gente não fez o reforço. Sem falar que com o tempo a imunidade cai. Será possivelmente como a gripe, a cada ano uma nova vacina com as cepas circulantes do período.

Existe a possibilidade de uma nova onda de casos?

Joana D’Arc Gonçalves: Sim. Veja o que está ocorrendo na China. Mas acredita-se em um vírus mais atenuado e com menor letalidade. Quanto maior o número de vacinados, menor a possibilidade de novas ondas.

Em algum momento deixar de usar a proteção será seguro ou ela veio para ficar?

Hemerson Luz: Certamente a máscara deixará de ser utilizada pela grande maioria das pessoas. Apesar de o momento atual ser de cautela, principalmente em transporte público, em situações onde a ventilação não é adequada, em locais fechados, e com uma grande concentração de pessoas.

Em quais locais ainda é recomendado o uso de máscara?

Joana D’Arc Gonçalves: A máscara ainda é recomendada em locais com maior risco de transmissão do SARS-CoV-2, ou seja, onde não há distanciamento físico suficiente, lugares fechados e com aglomeração como em transporte público (trens, metrô, ônibus e correlatos) agências bancárias, repartições públicas, lotéricas e instituições de ensino, entre outros. Em lugares abertos: pontos de ônibus, filas de atendimento de serviços públicos ou privados, ruas que funcionam como corredores comerciais e outros lugares com características semelhantes e em serviços de Saúde. Essas são as recomendações da Sociedade Brasileira de Infectologia e do Ministério da Saúde. Vale lembrar que você pode usar a máscara sempre que achar necessário, em situações que você avalia de risco, mesmo não estando descritas aqui.

Quem está vacinado não precisa se preocupar e pode ficar sem a máscara?

Joana D’Arc Gonçalves: Mesmo os vacinados podem se infectar, a opção de retirar a máscara envolve vários fatores. Se tivermos baixa circulação viral e alta taxa de imunizados, não tem problemas tirar a máscara. Mas lembramos que em muitas situações o uso da máscara pode te proteger, não só contra covid-19.

Quais são os tipos de máscaras mais indicados para este novo momento?

Hemerson Luz: A máscara que tem a melhor filtragem é a máscara denominada, ou melhor, classificada como PFF2 ou N95, pois ela apresenta uma capacidade de filtragem de até 95% dos micro-organismos. Caso a pessoa não queira utilizar, ou não tenha acesso a essas máscaras, ela pode utilizar uma máscara cirúrgica com a máscara de pano por cima. Tem a capacidade de filtrar até 92,5%. É uma boa proteção. A máscara cirúrgica, ela tem uma indicação também apesar de ter uma eficácia um pouco menor. A máscara de pano, somente ela, não é recomendada para locais principalmente onde tenham pessoas sintomáticas ou em lugar de atendimento de saúde.

Posso flexibilizar o tipo de máscara?

Joana D’Arc Gonçalves da Silva: Considerando a taxa de transmissão baixa, o ambiente ventilado, aberto e sem aglomeração é o ideal para tirar a máscara. Mas devemos ser cautelosos, sempre que visualizarmos a possibilidade de riscos lançar mão das medidas preventivas: máscara, distanciamento, higiene de mãos e de superfície, etiqueta respiratória, entre outros. A máscara isolada ajuda, mas não é a única ferramenta.Crédito: Reprodução da Arte Revista Pesquisa Fapesp

Texto: Gabriella Tomaz, Nathália Guimarães e Thiago Quint
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